Imagine a seguinte situação: você é um policial; ao meio dia, na capital do seu estado, trânsito intenso, ocorre um imprudente acidente de trânsito com vítimas. Você chega ao local do sinistro, encaminha as vítimas pro hospital, mas o trânsito está engarrafado. Os dois automóveis do acidente estão impedindo a fluidez do trânsito. O que fazer? Você preserva o local do crime, de acordo com a lei, ou retira os veículos da via, a fim de que flua o tráfego?
É certo que estamos diante de um Local de Crime cuja preservação é comandada pelo Código de Processo Penal, senão vejamos:
art. 6º, “caput” e inciso I, CPP
Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:
I- dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado de conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais (negrito nosso).
art. 169, “caput”, CPP
Para o efeito de exame do local onde houver sido praticada a infração, a autoridade providenciará imediatamente para que não se altere o estado das coisas até a chegada dos peritos, que poderão instruir seus laudos com fotografias, desenhos ou esquemas elucidativos (negrito nosso).
Todavia, nos casos de acidente de tráfego, o policial poderá remover os automóveis do local do acidente, mesmo sem autorização dos peritos, veja o que diz a lei:
art.1º, Lei nº 5.970 de 13dez73, que modifica os arts 6º e 169 do CPP
Em caso de acidente de trânsito, a autoridade ou agente policial que primeiro tomar conhecimento do fato, poderá autorizar, independente de exame do local, a imediata remoção das pessoas que tenham sofrido a lesão, bem como dos veículos nele envolvidos, se tiverem no leito da via pública e prejudicarem o tráfico (negrito nosso).
Não é difícil se ver ofícios do Ministério Público solicitando explicações à Polícia Militar por terem, seus policiais, modificado a posição de veículos envolvidos em acidentes de tráfego. A lei 5970/73 é vigente em nosso ordenamento jurídico e autoriza a polícia outorgar a imediata remoção dos veículos, independente de perícia.
Tivemos neste domingo noticiado na imprensa baiana a instauração de sindicância, no seio da PM, visando apurar os motivos pelos quais os policiais da 52ª CIPM, em Lauro de Freitas, não chamaram a Polícia Técnica para fazer a perícia do local do acidente que matou uma mulher e filha, na última sexta-feira, dia 18, em Ipitanga.
Acontece que, quando a lei autoriza o policial a desfazer o local do acidente e prestar socorro às vítimas, mesmo na ausência dos peritos, ela desloca a este policial a responsabilidade de documentar os detalhes do sinistro, como perito “ad hoc”, como acontece muito no interior do estado, em que policiais preenchem o RAT – Registro de Acidente de Trânsito e, no campo 123 (diagrama do acidente), fazem o croqui do sinistro. O parágrafo único da Lei 5970 diz que ele deverá consignar o fato e todas as demais circunstâncias necessárias ao esclarecimento da verdade.
A lei nº 6174 de 09dez74, que modifica o Código de Processo Penal Militar, ainda é mais clara e diz que o agente policial deverá lavrar boletim, registrando a ocorrência com todas as circunstâncias necessárias à apuração de responsabilidades, e arrolará as testemunhas que a presenciarem, se houver.
No caso concreto, as vítimas foram levadas ao Hospital Geral do Estado pelo Helicóptero do GRAER da Polícia Militar, o que demonstra a ação eficiente dos policiais militares no atendimento a este tipo de ocorrência. Além disso, o autor, motorista de um Ford Ecosport, que imprimia alta velocidade, se evadiu do local.
Como não havia mais, no local, nem veículo, nem vítimas, nem autor, não seria social e juridicamente aceitável que os policiais militares se utilizassem da função de perito “ad hoc”? A resposta positiva contaria com as seguintes considerações:
1. Que o policial militar é servidor;
2. Que ele é responsável pela ordem pública;
3. Que tem presunção de legitimidade nas ações;
4. Que possui documento próprio para registro de acidente trânsito, o que configura um documento oficial
5. Que foi a primeira autoridade a chegar no local e a ter que decidir no momento de caos sobre as decisões mais cabíveis, observando inclusive os critérios de necessidade e razoabilidade;
6. Que a lei autoriza o procedimento;
7. Que avaliando as circunstâncias, há o fator vida e ordem pública que precisam ser imediatamente garantidos.
Assim entendo que embora seja importante a apuração da ocorrência em sindicância, é bom pontuar que as circunstâncias devem ser analisadas de todos os ângulos, inclusive dos policiais militares que, provavelmente, acionaram a Central de Telecomunicação, informando sobre a ocorrência.
Respondendo à pergunta inicial, tanto preservar o local como fazer fluir o tráfego são posturas consoantes com a lei. Caberia a você julgar a medida mais oportuna para a ocorrência.
É o que penso, sob censura.
Texto extraído do Blog: Abordagem Policial.
quarta-feira, 23 de dezembro de 2009
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